quinta-feira, 19 de maio de 2011

Mudança de planos

Bom gente...

Agora com as coisas mais calmas, estou tentando organizar a vida. Minha idéia inicial era de pegar as crianças e o Marlon e ir para Floripa, na casa dos meus pais, e passar uns dias por lá. Aliás, essa era a recomendação de todos os médicos e psicólogos.

Na verdade, como minha cabeça não está funcionando direito, fico com medo de ficar sozinha com as meninas e o Marlon. Não consigo seguir uma linha de raciocínio muito bem, esqueço o que estou falando no meio da frase e mesmo quando saio, esqueço o que fui fazer... Esta semana estou vendo se consigo uma consulta com um psiquiatra para ver se podem me ajudar a ter um pouco mais de concentração.

Mas, meus pais vão receber visita e não há lugar na casa deles para nós. No desespero, comprei uma passagem para a madrinha da Helena que veio no mesmo dia para ficar com a gente e me ajudar. Está sendo uma mão na roda. Ela deve ficar até o início do mês, quando a Helena faz aniversário.

Depois minha mãe vai ficar mais uma semana (já estava com a passagem marcada antes disso tudo) e espero até lá ter melhorado um pouco para poder ficar sozinha.

Algumas coisas estão melhorando. Todos os dias passo na frente da padaria onde foi o tal assalto para levar Helena à escola. Hoje pela primeira vez não fiquei olhando lá para dentro e imaginando a cena. Quando percebi, já tinha passado...

sábado, 14 de maio de 2011

Tentando organizar os pensamentos


Oi gente

Primeiro eu queria agradecer por todos os recadinhos aqui no blog, no Face e por e-mail. É maravilhoso ter o apoio de todos vocês.

Agora as coisas estão mais calmas, embora minha cabeça esteja bem confusa. Para mim, é difícil organizar pensamentos e elencar tarefas a serem cumpridas. Embora eu já esteja bem, quando olho para dentro, parece que a cabeça está oca. É bastante angustiante.

Minha psicóloga me disse que é normal... seria o tal do pós-trauma. Segundo ela, o cérebro precisa se reorganizar. Tomara que não demore muito...

O assaltante que atirou no Marlon já foi preso e acho minha reação estranha. Todos ficam me falando algo... "Bandido bom é bandido morto" ou "Coitado, vai sofrer muito", etc.  Enquanto isso, fico pensando comigo mesma: "O que EU sinto por esta criatura?"  E acho que a resposta é nada... Sei que não sinto raiva como sempre achei que sentiria quando via notícias na TV de situações parecidas. Acho que não sinto pena dele como pessoa.  Também não o desprezo. Não desejo nada a ele, nem de bom nem de ruim.

Acho que pela primeira vez, experimento a total indiferença verdadeira. Mas isso não é estranho? Não deveria sentir algo? Esse homem quase acabou com meu sonho de felicidade! Bom... não sinto,

Só o que sei é que acho um horror que um rapaz tão novo não tenha nenhum amor à vida, que não seja capaz de considerar antes de atirar em um pai de família. É uma falta de valores, de amor, de tudo... Fico pensando se as coisas poderiam ser melhores. Será que se o sistema reeducasse alguém tudo isso poderia ter sido evitado? Ele já tinha passagem quando adolescente. Será que naquela época já não havia esperança? Só Deus sabe...

Agora minha preocupação é outra. As pessoas me dizem que não devo pensar nisso, mas é inevitável. Quantos anos ele fica preso? 3, 4... isso se não fugir antes... Não quero passar meus dias contando o tempo que ele ainda tem para cumprir. Me aconselham dizendo que a gente não pode se deixar abalar mas, cansei de ser forte. Não quero encarar mais essa. Minha coragem ficou na sala de parto. Quando penso nas minhas filhas, tenho certeza de que quero deixar Cuiabá para trás.

Temos amigos maravilhosos por aqui. Mas sei que são amigos para a vida toda. Vou sentir saudades mas daremos um jeito de nos ver. Agora quero ver se vamos para mais perto da família e mais longe desse cara.

domingo, 8 de maio de 2011

A pior semana da minha vida

Bom gente. Tem coisas na vida que a gente nunca espera. Na sexta passada (29), uma dessas aconteceu comigo. Tudo corria como sempre.

Na hora do almoço, Marlon trouxe Helena, comemos, colocamos as três pequenas na cama e fomos ficar juntinhos. Temos sempre uns dez minutinhos para isso.

Depois, meu amor me deu um beijo, se despediu como sempre e quase que nunca mais volta para nós.

Por volta de umas 14:30, uma amiga me ligou dizendo que vinha com a irmã me ver. Achei estranho pois ela trabalha muito e normalmente não teria tempo mas, comecei a dar um jeito nas coisas.

Dez minutos mais tarde, uma outra amiga me ligou. Disse que eu ficasse calma que ela vinha me buscar e levar para o hospital pois o Marlon tinha sido baleado em um assalto.

O chão me faltou. Não havia como escolher uma roupa. Pegava duas calças, depois duas blusas. Por fim, botei qualquer roupa. Chamei uma vizinha e a Flávia trouxe Carol para ficar com as crianças.

Quando cheguei no hospital, vi o corredor cheio de amigos e percebi que a coisa era pior do que eu pensava. A princípio me disseram que ele tinha sido baleado no ombro e pensei que não seria nada muito complicado. A cirurgia, na minha cabeça seria para extrair a bala, ou algo parecido.

Hoje já sei que o médico disse aos nossos amigos que dificilmente ele sobreviveria e que eles tinham me chamado para que eu me despedisse.

O tempo foi passando e somente quando já havia 4 horas de cirurgia, um cirurgião saiu da sala e começou a me explicar o que realmente ocorrera. Marlon perdera todo o sangue do corpo. Tinha tomado 10 bolsas de transfusão pois a veia cava fora atingida. Além disso, quebraram a costela dele pois a bala perfurou o pulmão, passando a um dedo do coração. Mas ele estava estável e outra equipe assumira para fazer a reconstrução do ombro.

Foram mais duas horas de cirurgia e o cirurgião vascular saiu da sala. Ele nos falou que foram arrebentados 5 cm da veia sub-clava que não foram reconstruídos pois eles acharam que ele não resistiria à operação. O resto estava no lugar e as possíveis sequelas iam da perda do braço à perda de movimentos total ou parcial.

Fiquei arrasada mas, pelo menos ele estava vivo. Quando ele saiu do centro cirurgico, estava branco como papel, com os lábios inchados pelo respirador e sedado ainda. Conseguiu abrir os olhos e olhar para mim. Lhe disse que estava ali e que esperava por ele quando ele ficasse bom. Eu e as meninas. Subi no elevador com ele e fui até a porta da UTI.

Depois que ele entrou, me deram uma lista dos itens de higiene pessoal que ele precisava. Fui à farmácia ao lado do hospital e levei tudo na UTI. Depois, pedi que me levassem para casa para ver minhas filhas. Tinha que amamentar as gêmeas. Chegando em casa, amigas e vizinhas tinham cuidado das meninas para mim. A casa acalmou mas eu não dormia. Fui para a rua caminhar. De dois em dois minutos eu tinha uma crise de choro. Era uma sensação de solidão horrível. Meu companheiro não estava comigo e eu não podia estar com ele. Minha vontade era de estar sentada na porta da UTI e acho que eu teria feito isso se não tivesse que amamentar minhas filhas.

No dia seguinte pedi a um amigo que me levasse até o hospital para que eu tivesse notícias. Todo o tempo eu pensava em como seria minha vida se o Marlon não resistisse. Minhas três filhas não teriam pai. Eu iria embora de Cuiabá? Para onde? Fazer o que? O amor da minha vida poderia nunca mais se deitar ao me lado. Nunca mais beijar as filhas. E eu nem tinha tido chance de me despedir.

Quando cheguei no hospital, encontrei outro amigo. Eles tinham se revezado a noite toda na porta da UTI. Um médico amigo nosso apareceu e entrou lá para ter notícias. Marlon estava estável mas continuava correndo risco. Se recuperava bem mas, ainda não estava fora de perigo. Eu só poderia vê-lo no final da tarde. Fui para casa e, por mais que deitasse, não conseguia tirar da cabeça a imagem dele sendo baleado. Deitei na cama mas não podia fechar os olhos. Comida eu não podia nem imaginar. No máximo, líquidos.

Antes do horário de visitas, tomei um banho e coloquei uma roupa melhor. Não queria que ele ficasse preocupado por minha causa. Não podia chorar na sua frente. Tinha que estar bem. As meninas estavam sendo ainda cuidadas por amigas e assim continuou até segunda quando minha sogra chegou.

Quando entrei lá, o cobri e comecei a conversar com ele. Eu não podia alcançá-lo para dar um beijo. Na garganta um cateter, fios para monitorá-lo no peito, soros, curativos e etc. Ele ainda estava branco como papel mas já passara para a unidade semi-intensiva pois estava consciente. As notícias eram boas. Ele se mantivera estável, o braço respondia bem ao tratamento, não havia inchado e havia movimento nos dedos.

Voltei para casa. Continuava sem comer e sem dormir. Quando alguém tirava Helena de casa, eu me permitia chorar. Mal conseguia andar. Na frente dela, era só sorrisos. Para ela o papai estava viajando e logo voltaria.

Olhava as roupas dele pela casa e não conseguia guardá-las. Seu sapato estava no canto do quarto e não podia olhá-lo nem guardá-lo. Minha mente estava vazia. Eu não conseguia pensar em qual era o próximo passo. Graças a Deus que os amigos foram maravilhosos e cuidaram de tudo para mim.

No domingo de novo fiquei de manhã no hospital para ter notícias. Não encontrei com o cirurgião vascular. Liguei para ele e ele me disse que o Marlon estava tendo uma recuperação muito melhor do que o esperado e que por ele teria alta da UTI. Faltava a opinião do cirurgião de tórax.

De tarde, minha avó que não sabia de nada (e continua sem saber) me ligou e tive que fazer uma voz boa e dar risada com ela, brincar e dizer que todos estavam bem. Ainda estou estudando uma forma de contar para ela pois meus pais estão fora do país e não podem ir até lá.

No horário de visita ele já estava com uma cor muito melhor e eu comecei a ficar um pouco melhor também. Nesta noite eu consegui dormir da 01:30, às 5:00 e já levantei um pouco melhor.

Na segunda, me ligaram por volta do meio-dia dizendo que eu fosse ao hospital pois ele iria descer para o quarto. Fiz uma bolsa com algumas roupas para ele e saí correndo. Recepcionei ele, ajudei-o a se vestir e a partir daí é que minha cabeça começou a funcionar de novo, embora o trabalho tenha aumentado.

Só nesse dia é que consegui falar com minha mãe. Também nesse dia minha sogra chegou. A Flávia que já a conhecia foi buscá-la e a levou direto para o hospital.

A partir daí as coisas começaram a melhorar. A cada dia o Marlon parecia melhor e depois que tirou o dreno que estava no pulmão, parecia estar novo.

Sem o dreno, conseguimos colocar uma camisa nele e levei a Helena para vê-lo pois ele sentia muita falta dela e ela já não veria os ferimentos. Foi emocionante levar ela até lá e pensar que tinha sido por pouco que eu poderia nunca mais ver essa cena.

Ao final de uma semana, o médico deu alta e agora meu amor está conosco novamente.

Logo no primeiro dia a Helena saiu para brincar com a avó e o Marlon subiu para descansar. Quando ela voltou me olhou séria e perguntou para mim: "cadê o papai?" e eu "Está descansando". Ela ficou desconfiada e pediu para ir fazer bagunça com ele na cama. Eu falei para ela que ele não podia fazer bagunça mas que ela poderia subir para dar um beijo nele. Eu senti que ela estava com medo que ele tivesse ido embora de novo. Ela subiu, o viu e depois desceu e brincou o dia todo tranquila.


Marlon ainda sente dor mas já brinca com as filhas, faz as refeições conosco e dorme ao meu lado. O resto é resto.




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